
As autoridades de São Paulo investigam seis mortes possivelmente ligadas ao consumo de bebidas contaminadas com metanol. Até o momento, 22 casos de suspeita de intoxicação foram registrados, sendo cinco confirmados e 17 ainda em análise. Os casos, até o momento, envolveram apenas destilados, mas a preocupação se estende a outras bebidas, como vinhos e cervejas.
Presença natural em vinhos e cervejas
Apesar de os casos recentes estarem ligados especificamente a bebidas destiladas, o metanol também pode aparecer, ainda que em quantidades pequenas, em produtos fermentados como vinho e cerveja.
O analista químico Siddhartha Giese, do Conselho Federal de Química (CFQ), explica que a substância pode surgir naturalmente durante o processo de fermentação de frutas ricas em pectina, como uvas, maçãs e ameixas.
“Durante a fermentação, a pectina pode ser degradada por enzimas que liberam metanol. Esse processo ocorre de forma natural e, quando controlado, resulta em concentrações seguras ao consumo”, esclarece.
O risco aumenta em fermentações espontâneas ou mal controladas, nas quais microrganismos, como leveduras e bactérias pectinolíticas, podem intensificar a liberação da substância. Fatores como uso de frutas muito maduras, temperaturas elevadas e falta de controle microbiológico também favorecem a formação do metanol.
Mesmo assim, os níveis registrados em bebidas fermentadas costumam estar dentro dos limites considerados seguros. A legislação brasileira estabelece que vinhos tintos podem conter até 400 mg por litro de metanol, enquanto vinhos brancos e rosados têm limite de 300 mg por litro.
“Esses valores são muito inferiores às doses tóxicas para humanos, que começam em cerca de 8 gramas de metanol ingerido. Portanto, o vinho produzido dentro das normas não representa risco à saúde”, detalha Giese.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a concentração de metanol na cerveja varia entre 6 e 27 mg por litro, quantidade considerada segura para o consumo. Nos destilados, o valor pode chegar a 220 mg por litro – porém, nesse tipo de bebida, o metanol pode ficar concentrado, aumentando o risco.
Maior perigo está nas adulterações
O grande risco não está na formação natural do metanol, mas na adulteração intencional das bebidas. A prática, considerada criminosa, ocorre quando o metanol é adicionado para aumentar o teor alcoólico aparente de produtos de baixa qualidade ou de fabricação irregular.
“A substância pode ser misturada a qualquer tipo de bebida, inclusive vinhos e cervejas, o que torna a contaminação perigosa. O metanol é incolor e tem sabor semelhante ao etanol, dificultando a identificação sensorial”, alerta Giese.
Não há método caseiro seguro para detectar a presença da substância. Alterações de sabor ou odor podem indicar irregularidades, mas nem sempre são perceptíveis. Outras pistas incluem preços muito abaixo do mercado, ausência de selo fiscal e origem duvidosa.
A recomendação dos especialistas é comprar apenas bebidas regulamentadas e produzidas por fabricantes reconhecidos, evitando produtos vendidos de forma informal.
O metanol é uma substância altamente tóxica quando ingerida. No organismo, ele se transforma em compostos, como formaldeído e ácido fórmico, responsáveis pelos danos mais graves. A oftalmologista Stefânia Diniz, do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), explica que essas substâncias podem lesar diretamente o nervo óptico e o sistema nervoso central.
Segundo ela, o ácido fórmico provoca um tipo de asfixia celular, impedindo que o oxigênio chegue às células, mesmo quando está disponível no sangue. “As células do nervo óptico e da retina são muito sensíveis à falta de oxigênio, e por isso podem sofrer inflamação, inchaço e degeneração, levando à perda de visão”, afirma.
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