A retatrutida é uma molécula ainda em fase de estudos para o tratamento da obesidade e de distúrbios metabólicos. A substância acumula resultados científicos impressionantes, que associam seu uso à perda de mais de 28% do peso corporal, o que chamou a atenção não só da comunidade científica, como também do mercado ilegal. Mesmo antes do lançamento internacional, versões fakes do remédio já dominam a internet.
Mesmo sem registro e antes até de ter um nome comercial (retatrutida é o nome do princípio ativo, assim como semaglutida é a do Ozempic), as versões fakes do remédio circulam pela web, com canetas falsas sendo vendidas por valores que vão de R$ 2,1 mil a R$ 3 mil.
As autoridades sanitárias e a criadora da molécula, a fabricante Eli Lilly, alertam que toda venda do medicamento é falsa e que é impossível saber o que está contido nas canetas que as pessoas estão aplicando em si mesmas.
O que é a retatrutida?
A retatrutida é baseada na ação combinada de três hormônios envolvidos no controle do apetite e na queima de gordura: o GLP1, que está no Ozempic e Wegovy, o GIP, que participa da composição do Mounjaro, e um terceiro princípio que ainda não havia sido usado em canetas emagrecedoras, o glucagon. Seus resultados de perda de peso em ensaios clínicos têm sido expressivos em todas as pesquisas feitas.
Entretanto, o medicamento ainda está em fase de estudos clínicos e não foi aprovado pela Anvisa ou por qualquer agência global — por isso, ainda não tem nem fabricação em escala industrial. Se aproveitando de variações do nome do princípio ativo, como retratutida e retratutide, vendedores clandestinos começaram a vender substâncias variadas. Os falsificadores alegam que apenas importam o remédio da Inglaterra ou da Alemanha, mas o remédio não foi submetido para aprovação nem mesmo na Europa.
“Muitas das canetas emagrecedoras falsas são doses de insulina reembaladas, o que expõe o medicamento à contaminação. Em outros casos, é um conjunto de substâncias placebo que não trazem efeito benéfico algum e podem expor o corpo a infecções, já que não há nenhum controle sanitário em sua produção”, explica a farmacêutica Érica Silva, de Brasília.
Quando a retatrutida chega ao Brasil?
Diante do tempo necessário para a conclusão dos estudos de fase 3 e da análise regulatória, ainda não há data para que o remédio verdadeiro chegue às prateleiras. Segundo Eli Lilly, o medicamento ainda está em estudos e não há data para o lançamento, embora especialistas indiquem que a submissão à Anvisa deva ocorrer ainda em 2026.
“Atualmente, a molécula está em ensaios clínicos de fase 3 e não é aprovada por nenhuma autoridade regulatória do mundo. Isso significa que a molécula não pode ser comercializada ou utilizada legalmente fora dos estudos clínicos. Tentativas de manipular a retatrutida representam sérios riscos à segurança dos pacientes, semelhantes às preocupações acerca da manipulação em larga escala da tirzepatida (Mounjaro). Esses produtos não foram testados, não possuem aprovação regulatória e podem conter ingredientes nocivos”, alerta a fabricante.
Mercado irregular abastecido
Já há, porém, abundantes registros de apreensão de produtos falsificados ou contrabandeados vendidos pela internet. Neste cenário, um dos casos mais chamativos foi o de uma passageira presa em junho no Aeroporto Internacional de Salvador portando 60 unidades de Synedica Retatrutide, uma falsificação do remédio. Ela tentava trazer as canetas da Europa para o Brasil.
“O consumo de medicamentos não planejados ou fora dos canais de vigilância sanitária representa sérios riscos à saúde, incluindo efeitos colaterais imprevisíveis e falta de garantia sobre sua segurança, qualidade e eficácia”, alertou o Conselho Federal de Farmácia (CFF) à época da divulgação do caso.
Apesar da ação policial, a marca Synedica segue vendendo o produto falsificado em um site no Brasil, com importação a R$ 1,8 mil reais a dose. A empresa admite não ter registro na Anvisa, mas afirma ser original e até possui um tira-dúvidas no site para diferenciar as canetas “originais” das falsas.
A empresa diz ter vendido unidades para 2,9 mil clientes. Até a quantidade alegada do falso remédio é drasticamente maior do que a que está em estudos: a caneta fake diz ter 40 mg de retatrutida, mas os testes de dose máxima são de 12 mg.

Mounjaro também passa por falsificação
O Mounjaro, cujo princípio ativo é a tirzepatida, também é produzido pela Eli Lilly e a fabricante afirmou ter analisado amostras ilegais do remédio em diferentes países.
A análise identificou falhas graves de segurança, esterilidade e eficácia, incluindo presença de bactérias, níveis elevados de impurezas, alteração de cor e até composição química diferente do medicamento original. Em alguns casos, o produto era apenas álcool de açúcar.
As autoridades reforçam que a compra de medicamentos deve ocorrer exclusivamente em farmácias e drogarias autorizadas, pois produtos de origem duvidosa expõem o consumidor a riscos significativos.
“A segurança dos pacientes é a maior prioridade para a Lilly e todos os nossos medicamentos passam por testes rigorosos e são submetidos para aprovação das agências regulatórias, como é o caso da Anvisa no Brasil, para garantir segurança, qualidade e eficácia. Medicamentos comprados de fontes não regulamentadas e aprovadas, incluindo farmácias de manipulação, não estão sujeitos a esses padrões e podem colocar os pacientes em perigo. Ninguém deveria correr o risco de usar produtos não testados, não regularizados, manipulados ou falsificados”, conclui a nota da fabricante.