
Pesquisadores descobriram que o glioblastoma, a forma mais letal de câncer cerebral, não se limita apenas ao cérebro. Enquanto se desenvolve, ele também corrói o crânio, muda a composição da medula óssea e afeta o sistema imunológico.
O estudo, publicado na sexta-feira (3/10) na revista Nature Neuroscience, reforça as evidências de que o glioblastoma é uma doença sistêmica e não local. A descoberta foi liderada por pesquisadores do Montefiore Einstein Comprehensive Cancer Center (MECCC), do Albert Einstein College of Medicine, nos Estados Unidos, em parceria com instituições japonesas e suecas.
Por ser altamente agressivo e se desenvolver rapidamente, o glioblastoma é uma condição difícil de tratar. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer dos EUA, mesmo sendo tratados com a terapia padrão, incluindo cirurgia, quimioterapia e radioterapia, pacientes vivem em média 15 meses após o diagnóstico.
“Nossa descoberta de que esse câncer cerebral notoriamente difícil de tratar interage com o sistema imunológico do corpo pode ajudar a explicar por que as terapias atuais — todas elas lidando com o glioblastoma como uma doença local — falharam”, ressalta um dos autores do estudo, Jinan Behnan, do MECCC, em comunicado.
Como o câncer age no organismo
Utilizando técnicas avançadas de imagem, os pesquisadores analisaram camundongos que desenvolveram dois tipos distintos de glioblastomas. Foi descoberto que ambos causavam erosão nos ossos cranianos, principalmente em regiões onde eles se juntam. Ao comparar a imagem da tomografia computadorizada de um paciente com glioblastoma com a dos ratos, foi possível perceber que a redução na espessura craniana aconteceu nas mesmas áreas cerebrais.
Também foi identificado que as erosões cranianas aumentaram a quantidade e o diâmetro de canais que ligam o crânio e o cérebro. A hipótese dos cientistas é que essas aberturas permitem que o câncer “converse” com à medula óssea craniana – local onde se formam células do sistema imunológico.
Menos imunidade e mais inflamação
Através do sequenciamento de RNA de célula única, a equipe identificou que o contato do glioblastoma com a medula afetou o equilíbrio das células imunológicas, aumentando a presença de células inflamatórias, como neutrófilos. Ao mesmo tempo, a doença reduzia as células do tipo B, importantes para o organismo reconhecer e atacar tumores.
Todo o processo ocorre em duas partes da medula óssea: no crânio e no fêmur. Na primeira, o câncer ativa os genes para aumentar a inflamação. Na segunda, “desliga” os genes que produzem células de defesa. Como atua em partes distintas do corpo, aumenta a evidência que o glioblastoma é uma doença sistêmica e não local.
Segundo os pesquisadores, esse mecanismo torna o câncer mais agressivo e até mesmo intratável em alguns casos. “Isso indica a necessidade de tratamentos que restaurem o equilíbrio normal das células imunes na medula craniana de pessoas com glioblastoma. Uma estratégia seria suprimir a produção de neutrófilos e monócitos pró-inflamatórios e, ao mesmo tempo, restaurar a produção de células T e B”, explica o coautor do artigo, E. Richard Stanley.
Testes com medicamentos
A equipe fez testes com medicamentos indicados para osteoporose na tentativa de impedir a corrosão do crânio. Foram utilizados o ácido zoledrônico e denosumabe, ambos aprovados pela Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos EUA.
Apesar de impedirem a erosão craniana, o ácido zoledrônico fez o tumor crescer mais rápido em um tipo de glioblastoma. Além disso, os dois atrapalharam a ação imunoterápica de outro medicamento utilizado no tratamento para estimular o sistema imunológico a atacar o tumor.
Por fim, os pesquisadores ressaltam a importância de encontrar novas terapias para tratar a condição. “Esperamos que nossa descoberta leve a melhores estratégias de tratamento”, finaliza Behnan.
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