O nome pode soar curioso, mas a síndrome do coração de feriado é um problema real. Trata-se de uma arritmia cardíaca provocada pelo consumo excessivo de álcool, comum em períodos de lazer, festas, fins de semana ou feriados prolongados.
Embora muitas vezes passageira, a condição pode causar sintomas intensos, como palpitação, falta de ar, tontura e dor no peito, exigindo avaliação médica imediata.
Segundo o cardiologista Ricardo Cals, do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, o álcool afeta o coração de forma direta e multifatorial. “Ele provoca lesão nas células cardíacas, altera o metabolismo e causa desequilíbrio elétrico no músculo.”
Além disso, o efeito diurético do álcool favorece a perda de minerais essenciais como potássio e magnésio, o que aumenta o risco de arritmias. “Mesmo quem não tem o hábito de beber pode apresentar sintomas se exagerar no consumo”, alerta o especialista.
O distúrbio costuma aparecer de 24 a 72 horas após o consumo exagerado de bebida alcoólica — o que explica por que muitos pacientes chegam aos pronto-socorros na segunda-feira, após o fim de semana.
“As queixas mais comuns são palpitação, batimentos irregulares, falta de ar, sensação de desmaio e dor torácica”, descreve o cardiologista Guilherme Saba Arruda, coordenador da UTI Cardiológica do Hospital São Luiz, em São Paulo.
Em casos mais graves, pode haver necessidade de cardioversão elétrica — procedimento em que um pequeno choque é aplicado para restaurar o ritmo normal do coração. De acordo com os especialistas, a principal arritmia associada à síndrome é a fibrilação atrial, quando o coração bate de forma descompassada e irregular.
Embora geralmente passageira, a alteração pode aumentar o risco de formação de coágulos e acidente vascular cerebral (AVC) em pessoas com predisposição. A indicação de uso de anticoagulantes depende da avaliação médica e dos fatores de risco individuais.
Entre os principais gatilhos estão não apenas o álcool, mas também a combinação com energéticos, café, privação de sono e desidratação. O cardiologista Lázaro Fernandes de Miranda explica que a estimulação excessiva do sistema nervoso e a queda dos níveis de eletrólitos podem acentuar a resposta cardíaca, provocando batimentos acelerados e irregulares.
“O abuso de álcool é o principal fator, mas noites mal dormidas e o uso de estimulantes também favorecem a síndrome”, resume Fernandes.
O quadro tende a ser mais frequente em homens, embora também afete mulheres. Estudos citados pelos especialistas estimam que até 3% dos atendimentos de emergência estejam relacionados a arritmias desse tipo — número que pode aumentar significativamente após feriados prolongados e festas de fim de ano. No Brasil, embora faltem estatísticas específicas, os médicos relatam aumento visível de casos nessas datas.
Principais sintomas da síndrome do coração de feriado
- Palpitações ou sensação de batimentos irregulares
- Falta de ar ou cansaço repentino
- Dor ou pressão no peito
- Tontura, fraqueza ou desmaio
- Sensação de “coração acelerado” mesmo em repouso
O diagnóstico é feito com eletrocardiograma, que mostra o ritmo irregular do coração, e exames de sangue para checar eletrólitos, função renal e hepática, e marcadores cardíacos como a troponina.
Em alguns casos, o médico solicita ecocardiograma para avaliar se há alterações estruturais no órgão. “A maioria dos pacientes tem coração normal e melhora após hidratação e repouso”, afirma o cardiologista Alexandre Francisco, da Santa Casa de São José dos Campos.
O tratamento varia conforme o quadro clínico. Quando o paciente está estável, o controle dos sintomas e a hidratação costumam ser suficientes. Se houver instabilidade — falta de ar intensa, dor torácica ou desmaio —, pode ser necessário o uso de medicamentos endovenosos, como beta-bloqueadores ou amiodarona, e, em casos mais graves, a cardioversão elétrica. A anticoagulação permanente só é indicada se o risco de AVC for alto.
A síndrome também pode se manifestar de forma silenciosa, especialmente em pessoas que já têm hipertensão, sobrepeso ou predisposição genética para arritmias. Nesses casos, o álcool pode desencadear alterações elétricas no coração sem causar sintomas imediatos, o que retarda o diagnóstico.

Segundo os especialistas, isso explica por que alguns pacientes só percebem o problema dias depois, quando sentem fadiga, falta de ar ao esforço ou sensação de fraqueza. Por isso, o acompanhamento com um cardiologista é essencial mesmo após a melhora espontânea do quadro.
Outro ponto de atenção é a recorrência. De acordo com os especialistas, vários pacientes têm novos episódios quando voltam a consumir álcool em excesso. A repetição das crises favorece o surgimento de arritmias crônicas e até insuficiência cardíaca.
“O prognóstico é bom quando a causa é pontual e o paciente adota hábitos saudáveis, mas pode haver sequelas se o padrão de abuso se repetir várias vezes”, explica Saba.
Por isso, especialistas recomendam moderação, sono regular e hidratação constante como medidas simples, mas eficazes, para proteger o coração.
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