O presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, reiterou nesta quarta-feira (27/8) que a taxa básica de juros da economia brasileira deve permanecer em patamares elevados por um bom tempo, em meio aos esforços da autoridade monetária para conter a inflação, que segue rodando acima da meta.
Galípolo participou, no início da tarde, da abertura do 33º Congresso & ExpoFenabrave, promovido pela Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), em São Paulo.
Em sua última reunião, nos dias 29 e 30 de julho, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC decidiu manter a Selic em 15% ao ano e, assim, encerrar o ciclo de altas nos juros. Trata-se do maior patamar da Selic no país em quase duas décadas.
A taxa básica de juros é o principal instrumento do BC para controlar a inflação. Quando o Copom aumenta os juros, o objetivo é conter a demanda aquecida, o que se reflete nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. Assim, taxas mais altas também podem conter a atividade econômica.
Ao reduzir a Selic, por outro lado, a tendência é a de que o crédito fique mais barato, com incentivo à produção e ao consumo, reduzindo o controle da inflação e estimulando a atividade econômica.
A meta de inflação para 2025 é de 3%, com variação de 1,5 ponto percentual, com piso de 1,5% e teto de 4,5%, conforme estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Ela será considerada cumprida se oscilar dentro desse intervalo de tolerância.
Em julho, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que os preços de bens e serviços do país avançaram 0,26%. Em 12 meses até julho, a inflação acumula alta de 5,23%, acima do teto da meta (4,5%). No ano, o índice acumula alta de 3,26%. No mesmo mês de 2024, a variação foi de 0,38%.
“Quando nós olhamos para as projeções de mercado, no [Relatório] Focus, as expectativas para 2025 estão também fora da meta. As projeções do BC também estão fora da meta. No caso de 2026 e 2027, tanto as projeções de mercado quanto as do BC também se encontram fora da meta. É por isso que o BC fez esse movimento, de primeiro interromper o ciclo de cortes, parar, iniciar um ciclo de altas, até chegar a um patamar que consideramos restritivo com alguma segurança”, explicou Galípolo no congresso da Fenabrave.
“Essa taxa de juros deve permanecer nesse patamar restritivo por um período prolongado, justamente porque estamos em um cenário de ter descumprido a meta e com expectativas e projeções do BC e do mercado nas quais a convergência para a meta ainda está se dando de maneira lenta. É isso o que tem demandado uma política monetária mais restritiva”, prosseguiu o presidente do BC.
Galípolo ressaltou que, “a partir da determinação do CMN da meta de inflação, cabe ao BC, através do Copom, perseguir essa meta de inflação a partir da votação sobre qual deve ser a taxa básica de juros”.
“Vínhamos em processo de flexibilização monetária desde o fim de 2023 até meados de 2024, cortando a taxa de juros. Se você tem um processo de aceleração da inflação, você vê a inflação andar e a taxa de juros real está reduzindo. Quando o BC começa a subir os juros, o BC precisa subir mais do que a inflação está subindo. Ele precisa apertar mais”, observou o chefe da autoridade monetária.
“Ao final de 2024, a inflação fechou em 4,83%. Com a meta de 3%, uma banda de 1,5%, estourou a meta. Eu já assumi, em janeiro [de 2025], tendo que escrever uma carta ao ministro da Fazenda [Fernando Haddad] justificando por que não conseguimos cumprir a meta em 2024”, destacou o presidente do BC.
Segundo Galípolo, apesar dos efeitos dos juros altos sobre a atividade econômica do país, “o BC tem de olhar com mais parcimônia e não pode se emocionar com um dado pontual”.
Projeções para o PIB
Durante sua participação na abertura do congresso da Fenabrave, Gabriel Galípolo foi questionado sobre o desempenho da economia brasileira nos últimos anos, que tem se mostrado resiliente apesar dos juros altos.
“As projeções dos economistas nos últimos quatro anos se assemelham um pouco com aquele aplicativo que usamos no trânsito que dá uma estimativa de tempo de viagem quando você sai de casa, mas vai recalculando durante o trajeto. De forma geral, esse PIB vem surpreendendo nos últimos anos”, reconheceu Galípolo.
Segundo o presidente do BC, “o que aconteceu, do ponto de vista conjuntural, foi muito mais uma mudança na potência da política fiscal no estímulo da economia”. “As pesquisas foram fazendo revisões do PIB, mas não fizeram revisões do tamanho do déficit ou do tamanho da dívida do governo em relação ao PIB”, disse.
“Ao produzir uma política tributária mais progressiva e ter programas mais progressivos, você acaba, com a distribuição de renda, aumentando a propensão a consumir. E isso aumenta o dinamismo da economia”, explicou Galípolo.
Segundo o presidente do BC, “a renda tem se mostrado bastante resiliente” no país. “Apesar de os juros estarem nesse patamar, estamos com o menor nível de desemprego da série histórica. E estamos com o nível de renda mais alto do trabalhador”, observou.
Tarifaço
Galípolo também comentou os efeitos do tarifaço comercial imposto pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a diversos produtos importados de uma série de países, entre os quais o Brasil.
Segundo o presidente do BC, um dos maiores desafios para a economia global, neste momento, é o ambiente de “incerteza” gerado pelas tarifas.
“Há uma incerteza que vem das decisões de política econômica e comercial dos EUA. A incerteza, para desacelerar a economia, é das coisas mais eficientes, porque se deixa de investir e de consumir diante da incerteza”, afirmou Galípolo.
“Dada a centralidade da economia americana, sob o ponto de vista financeiro, em especial com o que se espera que virá com a revolução da inteligência artificial, você continua assistindo a um fluxo de investimento em busca de ativos no mercado americano”, ponderou. “O que há de novidade é que esses investidores querem mitigar o risco de desvalorização do dólar, que foi o que a gente assistiu recentemente.”
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